quarta-feira, 18 de novembro de 2015

A Única Coisa Prematura deveria ser a Informação!

Sobre a prematuridade e a incompetência cervical

Hoje, faz exatamente 75 dias que entrei em repouso, é um sabático quase sem fim com o tempo vazio e o coração cheio. E a cabeça? Ahhh... a cabeça... Essa anda em ritmo próprio com dias que seria capaz de concluir uma faculdade online em poucas semanas e outros que são eternos domingos mentais.

Coincidentemente, ontem foi o Dia Mundial da Prematuridade que visa divulgar os impactos do crescente nascimento de bebês prematuros o que me motivou ainda mais a escrever esse post, sobre Incompetência Istmo Cervical (IIC) - uma "doença" silenciosa, assintomática, desconhecida e mortal..

Há pouco tempo, descobri que não estou sozinha nessa jornada. Há um mundo que se cruza e se encontra na internet. Somente em um grupo do Facebook, há mais 4 mil mulheres na mesma situação com histórias de insucesso, vitória e esperança.

E é para esclarecer (um pouco) essa condição que dedico esse post. Lembrando que eu não sou médica, sou somente curiosa. Consultar um médico e nesse caso, um especialista em gravidez de risco é essencial.

Antes de qualquer coisa, uma questão de anatomia básica:
O colo do útero é a porção inferior da cavidade uterina por onde passa o bebê no nascimento. Esse canal, em condições normais, é responsável por "segurar" o peso do bebê, se mantém fechado em toda a gravidez e vai diminuindo seu comprimento gradativamente, até que, no trabalho de parto, ele fica tão fino que começa a abrir - a famosa dilatação.

Esse canal durante a gravidez deve se manter acima de 3cm e sofrerá um encurtamento natural no final da gestação.

Basicamente, a IIC é uma condição na qual o tecido do colo do útero  é mais fraco do que deveria, assim, durante a gestação, o peso do bebê faz com que o colo afine e se abra facilmente (geralmente por volta da 20a. a 24a. semana), causando um nascimento antecipado quase sem trabalho de parto. Na maioria das vezes, é tão prematuro que o bebê não tem chance alguma de sobrevivência. Aproximadamente, 1/4 dos abordos tardios (após 12a. semana de gestação) ocorrem por isso.

O que me assustou sobre o assunto é a falta de conhecimento e consenso médico, pesquisas e etc... Há pouquíssimos estudos, a única técnica existente para evitar a perda é de 1960, a maioria dos médicos são despreparados ou não buscam identificar a IIC (antes e durante a gestão), falta informação, não há sequer uma categorização de "níveis" de incompetência e com isso, faltam protocolos de tratamento. Até livros de maternidade (tipo o chatíssimo - opinião particular - "O que esperar enquanto se está esperando") ou sites para gestantes não contêm informações que possam direcionar as mulheres. Muitos colocam somente como encurtamento de colo, mas a IIC é mais do que isso, é uma fragilidade total do tecido.

A pouca literatura sobre o assunto diz que, aproximadamente, 1% a 5% das mulheres apresentam essa fragilidade de colo. Eu acredito que esse número é mais perto dos 5 do que do 1, porque IIC é subdiagnosticada e, via de regra (e dessa vez, eu sou exceção), o diagnóstico é tardio, ou seja, a mulher descobre que tem IIC após perder o bebê. Outro dado assustador é que a maioria somente é diagnosticada após perder o segundo (após a 2a. perda, o índice de mulheres com insuficiência cervical é praticamente 1/3).

O que causa a IIC?
 Tem quem nasce assim (IIC primária) ou pode ser adquirida (IIC secundária), ou seja, causada por traumas e agressões no colo (cauterizações, dilatação para curetagem, partos com forceps... são possíveis causas). Ou seja, a mulher pode não apresentar IIC na primeira gravidez e apresentar a partir da segunda devido a um parto mais 'forçado' ou outro procedimento invasivo.

Como diagnosticar?
Então...eis o problema!
Há alguns exames ginecológicos que podem indicar, mas não são os exames de rotina e pouquíssimos médicos solicitam a não ser em alguma investigação especifica (o que, de certa forma, eu entendo, porque se quem usa o serviço público mal consegue agendar um ultrassom). Pelo o que eu estudei, nenhum deles é conclusivo, mas o conjunto da obra pode ser.

São eles:

- Histeroscopia: é um exame feito em alguns laboratórios e hospitais, é invasivo e tem por objetivo verificar a cavidade uterina através de uma câmera. Obviamente que, para chegar lá, a câmera precisa passar pelo orifício do colo que será avaliado tanto morfologicamente quanto a passagem em si. Em uma mulher que nunca teve filhos, se o aparelho passar fácil, pode ser um primeiro indício. É o mesmo princípio da técnica das velas de Hegar, uns "palitinhos" de espessuras diferentes que o médico passa pelo canal, quanto maior o calibre e a facilidade de passagem pior a situação do colo. (Ser mulher não é fácil não e depois, os  homens reclamam do exame de toque, fala sério!...)

- Histerossalpingografia: é um raio X do útero, trompas e etc... mas, para isso, a cavidade uterina é preenchida com contraste. Também é feito em laboratório de diagnóstico, mas é dolorido e desconfortável. Além disso, muitos médicos que fazem o laudo não analisam o canal e se concentram nas trompas (porque esse exame indica entupimentos e etc). Se o médico de rotina não for experiente em ver a chapa do exame pode não identificar também. Mas pode-se dar a sorte que eu tive em ter os dois médicos preparados! Se você morar em São Paulo e tiver convênio, eu recomendo a Dra Carmen Navarro da equipe da Unifesp. Ela atende no laboratório Cura. Foi o único exame que eu fiz que outros médicos disseram:"eu só vou ver o laudo porque foi a Carmen que fez".
PS: para mulheres curiosas que gostam de ler laudos e tentar desvenda-los antes dos médicos, para o laudo desse exame, é melhor nem tentar, até quando o resultado é normal, os termos são intraduzíveis.

- Ultrassom: durante a gravidez, logo no início é possível diagnosticar a IIC se for realizada a medicação e acompanhamento das dimensões do colo. O US é um exame super simples que todas as mulheres já devem ter feito, mas, honestamente, conheço quase nenhuma gestante que o médico pediu essa medida no início da gestação. Muitos médicos somente solicitam, se houver histórico. Se o seu médico não pedir, a paciente pode pedir para o médico ultrassonografista na hora do exame mesmo.

Como tratar?
Tratamento no sentido estrito da palavra não existe. O que existe são técnicas e medicamentos para viabilizar uma  gravidez mais tranquila.

Cada médico tem uma conduta, mas o procedimento mais comum é o que chamamos de cerclagem ou circlagem. É um procedimento cirúrgico que literalmente amarra o colo (tipo um embrulho de
presente).

Se realizada de forma preventiva, entre a 13a. e 16a. semana, as estatísticas apontam para um parto viável entre 75% ou mais dos casos. Se for realizada de forma emergencial (o colo já apresenta dilatação) e após a 18a. semana, as estatísticas não são claras quanto ao seu benefício, porque quanto mais avançada a gravidez, maior o risco do próprio manuseio cirúrgico estimular um trabalho de parto. Entretanto, nesse grupo da internet que faço parte, há muitos casos de sucesso com cerclagens de emergência.

Após a 24a. semana, em decorrência do tamanho do bebê e da viabilidade do nascimento e sobrevivência (leia mais aqui), os clínicos não aconselham.

Os riscos. Toda cirurgia tem risco. Para a cerclagem, os principais são infecções e perfuração da placenta (em caso de idade gestacional avançada). A escolha de um cirurgião experiente é um grande fator de sucesso!!

Outros cuidados. Tem uma batelada de remédio!! Eles visam inibir contrações e dilação precoce, além de reforço com progesterona (o hormônio da gravidez), mas cada médico tem uma conduta diferente.

Repouso, repouso, repouso. A gravidade é cruel em muitos sentidos. Não é a toa que as pessoas fazem plástica quando o rosto começa a cair. Agora, imagine você, com um saco de 1kg de arroz dentro da barriga!Isso é o que pesa um bebê no início do 7o. mês de gestação! O repouso visa evitar o peso desse bebê nesse tecido fragilizado abra o colo ou force os pontos. Para as mães sem cerclagem, o repouso é absolutamente a única chance da gravidez se completar.

Há um site, que entra em detalhes sobre a cerclagem: www.cerclagem.com.br

E como faz para o bebê nascer?
Há condutas diferentes: alguns médicos já retiram os pontos na 36a. semana, pois o bebê está apto a nascer e aguardam somente o momento em que a mãe entra em trabalho de parto normalmente. Outros, somente retiram os pontos quando a mãe dá entrada no hospital já em trabalho de parto.

Mesmo se a gestante for fazer uma cesária, é necessária a retirada dos pontos. Pois toda a manipulação pode ocasionar rompimentos no colo.

Algumas literaturas desaconselham que mulheres cercladas façam parto normal, em decorrência de formação de fibrose (tipo uma cicatriz) nos pontos, o que impediria uma dilatação de "qualidade", ou de aumento da fragilidade do colo que pode por em risco uma segunda gestação. Mas, não há um consenso sobre isso também, pois, se houver a dilatação necessária para o nascimento sem pressão, não haveria problemas.

Para as futuras mamães com IIC, os casos de sucesso são muitos! Para as futuras mamães que não sabem se são portadoras dessa condição, peçam a medição e acompanhamento do colo, não custa mais e pode evitar muita dor de cabeça!

Outras leituras e fontes:

http://revistas.pucsp.br/index.php/RFCMS/article/viewFile/132/pdf
http://www.barini.med.br/questoes/11/pg/perguntas_e_respostas_sobre_a_iic_incompetencia_ou_insuficiencia_istmo_cervical

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